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sábado, 14 de dezembro de 2013

Lição da EBD n° 11: A ilusória prosperidade dos maus


A leitura de textos da lei (Lv 26; Dt 28) incutiu na cabeça dos santos do Antigo Testamento que a dinâmica da vida era regida por leis de causa e efeito, tal como ocorre na natureza. Daí o pensamento de que uma vez sendo justo o homem é recompensado em sua vida financeira pela sua justiça, e sendo mau, este é punido na esfera material por sua maldade. O livro de Provérbios, de certa forma, mantém este raciocínio tacanho ao colocar a prosperidade como algo decorrente da sabedoria (Pv 8. 18), ao passo que apenas insinua levemente que os ímpios prosperam (Pv 23. 17; 24. 1, 19). Eclesiastes vai na contramão deste pensamento de Provérbios, para pregador [ֹקֹהֶ֣לֶת (kohelet)] Ainda há outra vaidade que se faz sobre a terra: que há justos a quem sucede segundo as obras dos ímpios, e há ímpios a quem sucede segundo as obras dos justos. Digo que também isto é vaidade (Ec 8. 14 ARCF). Pior, para o pregador, não existe um suposto tratamento especial para os homens piedosos. Todos partilham um destino comum: o justo e o ímpio, o bom e o mau, o puro e o impuro, o que oferece sacrifícios e o que não oferece. O que acontece com o homem bom, acontece com o pecador; o que acontece com quem faz juramentos, acontece com quem teme fazê-los (Ec 9. 2 NVI). Esta realidade colocou os santos do Antigo testamento em crise.
 
I) A prosperidade dos maus
 
Um dos textos bíblicos em que se percebe a revolta para com a prosperidade dos maus é um salmo didático, cuja autoria é atribuída à Asafe, vejamos o texto:
Quanto a mim, os meus pés quase tropeçaram; por pouco não escorreguei.
Pois tive inveja dos arrogantes quando vi a prosperidade desses ímpios.
Eles não passam por sofrimento e têm o corpo saudável e forte.
Estão livres dos fardos de todos; não são atingidos por doenças como os outros homens.
Por isso o orgulho lhes serve de colar, e se vestem de violência.
Do seu íntimo brota a maldade; da sua mente transbordam maquinações.
Eles zombam e falam com más intenções; em sua arrogância ameaçam com opressão.
Com a boca arrogam a si os céus, e com a língua se apossam da terra.
Por isso o seu povo se volta para eles e bebem suas palavras até saciar-se.
Eles dizem: "Como saberá Deus? Terá conhecimento o Altíssimo? "
Assim são os ímpios; sempre despreocupados, aumentam suas riquezas.
Certamente foi-me inútil manter puro o coração e lavar as mãos na inocência,
pois o dia inteiro sou afligido, e todas as manhãs sou castigado.
Se eu tivesse dito "falarei com eles", teria traído os teus filhos.
Quando tentei entender tudo isso, achei muito difícil para mim (Sl 72. 2 - 16 NVI).
Para Asafe, a prosperidade dos ímpios se manifesta por meio de:
  1. Uma saúde invejável, visto que além de possuírem um corpo invejável e forte não são atingidos por doenças. A imunidade dos ímpios se manifesta em seu aparente estado psicossomático. A aparente ausência de fardos é a causa de não possuírem doenças.
  2. A prosperidade dos ímpios aqui descrita á a base do orgulho dos mesmos, bem como da insistência na prática do mal. Neste ponto o pensamento de Asafe coaduna com o de קֹהֶ֣לֶת (kohelet), visto que para este Quando os crimes não são castigados logo, o coração do homem se enche de planos para fazer o mal (Ec 8. 11 NVI).
  3. Em razão da natureza pecaminosa, o coração dos homens é voltado para a prática do mal (Gn 6. 5; 8. 21), no caso dos ímpios tal se agrava, visto que ele não é punido por sua maldade, antes sua prosperidade o engana, produzindo uma percepção falsa de que ele está em segurança.
  4. O mais interessante aqui, é a estranha aceitação popular pela qual passam. Safe afirma que o povo se volta para eles e bebem suas palavras até saciar-se (Sl 72. 10). Em nossos dias, estas palavras são mais atuais do nunca, visto que tudo em nossa sociedade é mensurado pelo ter. As pessoas associam a riqueza à benção e aprovação de Deus. Daí que o ímpio próspero tenha mais credibilidade do que o justo. Aqui cabe observar o que Cristo disse: Ai de vocês, quando todos falarem bem de vocês, pois assim os antepassados deles trataram os falsos profetas (Lc 6. 26 NVI).
  5. A prosperidade do ímpio faz com que ele desconsidere a Deus. Jó chega a expressar tal verdade por meio das seguintes palavras: Passam a vida na prosperidade e descem à sepultura em paz. Contudo, dizem eles a Deus: ‘Deixa-nos! Não queremos conhecer os teus caminhos. Quem é o Todo-poderoso, para que o sirvamos? Que vantagem nos dá orar a ele? (Jó 21.13 - 15 NVI). O texto nos revela uma sensação de autossuficiência tal que o homem chega a declarar com ações e palavras sua independência de Deus.
  6. O maior problema para homens justos como Jó e Asafe, não é a prosperidade dos maus, sendo concreta, ou ilusória, mas a contraditória punição imediata do justo. Certamente foi-me inútil manter puro o coração e lavar as mãos na inocência, pois o dia inteiro sou afligido, e todas as manhãs sou castigado (Sl 72. 15 NVI).
  7. Mesmo constatando a prosperidade dos maus Asafe não se sente à vontade para negar a Deus. Esta misteriosa pressão interna tem de ser causa de estudo para os teólogos. Todavia não são poucos os que motivados por esta contradição abandonam a integridade e a fé.
 II) O caráter ilusório da prosperidade dos maus
 
Se o texto de Asafe tivesse terminado por aqui, mas o salmista prossegue afirmando:
até que entrei no santuário de Deus, e então compreendi o destino dos ímpios.
Certamente os pões em terreno escorregadio e os fazes cair na ruína.
Como são destruídos de repente, completamente tomados de pavor!
São como um sonho que se vai quando a gente acorda; quando te levantares, Senhor, tu os farás desaparecer (Sl 73. 17 - 20 NVI). 
Este entendimento de Asafe é similar ao de Jeremias, veja:
Tu és justo, Senhor, quando apresento uma causa diante de ti. Contudo, eu gostaria de discutir contigo sobre a tua justiça. Por que o caminho dos ímpios prospera? Por que todos os traidores vivem sem problemas? Tu os plantaste, e eles criaram raízes; crescem e dão fruto. Tu estás sempre perto dos seus lábios, mas longe dos seus corações.
Tu, porém, me conheces, Senhor; tu me vês e provas a minha atitude para contigo. Arranca os ímpios como a ovelhas destinadas ao matadouro! Reserva-os para o dia da matança! (Jr 12. 1 - 3 NVI). 
Aqui, precisamos entender que:
Há um destino certo para os ímpios, independente do quanto eles prosperem, como o capim logo secarão, como a relva verde logo murcharão (Sl 37. 2 NVI), pois, o Senhor aprova o caminho dos justos, mas o caminho dos ímpios leva à destruição! (Sl 1. 6 NVI).  
Eles estão em terreno escorregadio. A mim pertence a vingança e a retribuição. No devido tempo os pés deles escorregarão; o dia da sua desgraça está chegando e o seu próprio destino se apressa sobre eles (Dt 32. 35 NVI).
Eles vivem uma destruição repentina, visto que quem insiste no erro depois de muita repreensão, será destruído, sem aviso e irremediavelmente (Pv 29. 1 NVI).  
A prosperidade do ímpio funciona, devido á atitude do mesmo para com Deus, e para com o seu estado, como o processo de engorda. No final, a inconstância dos inexperientes os matará, e a falsa segurança dos tolos os destruirá (Pv 1. 32 NVI). Fato é que de nada vale a riqueza no dia da ira divina, mas a retidão livra da morte (Pv 11. 4 NVI). Sim, o ímpio pode até prosperar, mas quando este morre, sua esperança perece; tudo o que ele esperava do seu poder dá em nada (Pv 11. 7 NVI).
 
III) A loucura da graça
 
ֹקֹהֶ֣לֶת afirma que: ao homem que o agrada, Deus recompensa com sabedoria, conhecimento e felicidade. Quanto ao pecador, Deus o encarrega de ajuntar e armazenar riquezas para entregá-las a quem o agrada. Isso também é inútil, é correr atrás do vento (Ec 2. 26 NVI). Não se afirma aqui que o homem que agrada a Deus sempre será rico, mas que indiretamente desfrutará da riqueza acumulada pelos pecadores.
Já falei a respeito de graça comum aqui neste espaço. Ela aparece na música (aqui), no futebol (aqui), na estrutura de pensamento cristão revelado no cinema (aqui), e mesmo na manifestação de dons sobre pessoas indignas (aqui), ressaltando que indignos todos somos. Esta graça coloca em xeque a nossa teoria da meritocracia, visto que no contexto da mesma, todos nós, justos ou injustos, felizes e realizados, ou não experimentamos as dadivas que Deus nos dá no presente (Ec 9. 7 - 9), e experimentaremos o mal da morte. Na visão do pregador, a morte iguala o homem feliz e o infeliz, o rico e o pobre.
Assim sendo, a saída do pregador é que o homem desfrute dos prazeres diante de Deus, consciente de que a sua vida é vaidade, e de que a mesma não é regida por leis de méritos. Afinal,
Todos partilham um destino comum: o justo e o ímpio, o bom e o mau, o puro e o impuro, o que oferece sacrifícios e o que não oferece. O que acontece com o homem bom, acontece com o pecador; o que acontece com quem faz juramentos, acontece com quem teme fazê-los. Este é o mal que há em tudo o que acontece debaixo do sol: O destino de todos é o mesmo. O coração dos homens, além do mais, está cheio de maldade e de loucura durante toda a vida; e por fim eles se juntarão aos mortos (Ec 9. 2, 3 NVI). 
e mais,
Os velozes nem sempre vencem a corrida; os fortes nem sempre triunfam na guerra; os sábios nem sempre têm comida; os prudentes nem sempre são ricos; os instruídos nem sempre têm prestígio; pois o tempo e o acaso afetam a todos. Além do mais, ninguém sabe quando virá a sua hora: Assim como os peixes são apanhados numa rede fatal e os pássaros são pegos num laço, também os homens são enredados pelos tempos de desgraça que caem inesperadamente sobre eles. Também vi debaixo do sol este exemplo de sabedoria que muito me impressionou (Ec 9. 11 - 13 NVI).
Nos Evangelhos Jesus ratifica a mensagem pregada pelo pregador, afirmando que o Pai que está nos céus. [..] faz raiar o seu sol sobre maus e bons e derrama chuva sobre justos e injustos (Mt 5. 45 NVI). Esta é a base na qual Deus trata os seres humanos,  A GRAÇA.
 
Em Cristo, Marcelo Medeiros.

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