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terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Futebol em luto


Sou botafoguense, mas não me considero um torcedor fervoroso. Talvez seja justamente este o motivo maior de ser torcedor do glorioso. Freud explica, me sinto solitário, nada mais coerente do que torcer pela estrela solitária, contanto que eu mesmo não seja um astro errante, como uns e outros por aí. Explicações à parte, minha grande ligação com o futebol advém não do futebol em si, mas da arte, antes comum. Em outras palavras: sei do caráter ideológico do futebol, do quanto ele incentiva a nossa cultura de massa (aqui), mas não posso deixar de apreciar a arte que via em Garrincha, Rivelino, Gerson, vi em Romário, Ronaldo Fenômeno, e vejo em Ronaldinho Gaúcho, Neymar, e entendo o que eles fazem como claro sinal da graça comum, um fenômeno mais que evidente em um mundo caído como o nosso e num futebol sujo como o nosso.
Creio firmemente que a catarse é o fenômeno que deveria acontecer com maior ocorrência em nossos estádios. Segundo Aristóteles, catarse é a "purificação" experimentada pelos espectadores, durante e após uma representação dramática. O poder amansador do futebol está justamente aí, e ao que tudo nos indica não é somente em nosso país que tal ocorre. Ingleses, franceses, espanhóis principalmente experimental e vivem tal fenômeno. Mas o leitor já deve ter percebido que ele está ligado à arte.
Uma séria distorção tem ocorrido quanto à cultura e a prática do futebol no mundo, e garotos como Neymar, que podem ser vistos aos montes em nossas peladas, não se firmam com frequência no futebol. Resultado, a arte está cada vez mais em baixa, e a catarse tem cedido o seu lugar à barbárie. Estádios que antes eram verdadeiros templos da arte cujos sacerdócio era exercido por nada mais, nada menos do que Zico, Júnior, Falcão, Alemão, Mauro Galvão, Romário, (para não falar naqueles que nenhuma habilidade possuíam, mas que a graça era tal sobre a vida deles que se tornaram  xodós da torcida), agora são verdadeiros coliseus, onde feras atacam covardemente pessoas indefesas.
Confesso que me senti muito chateado com a crítica feita por Johan Cruyff á seleção de Dunga (aqui), até porque a Holanda de 2010 nem de longe se compara à de 1974 e 1978, ou 1990, 1994, 1998, o carequinha que fez a diferença é um caso à parte no cenário atual. Mas hoje percebo que as palavras do mago holandês, eram proféticas. Num universo futebolístico onde a "eficiência" e o "resultado" são colocados acima da arte, garotos talentosos são preteridos pelos altos e fortes, dribles são substituídos por troca de passes (que tantos cabeças de bagre quanto craques podem fazer), o que se vê é uma torcida à altura do futebol que é apresentado nos estádios.
Longe de mim defender, ou justificar a violência vista no jogo Vasco X Atlético PR, (violência esta que começou com a falta de educação do povo para o espetáculo que o futebol tem de ser, prosseguiu com adoção de uma filosofia futebolística que privilegia a "eficiência", ao invés da arte culminou com a clara omissão dos envolvidos na organização do jogo que não colocaram policiamento no estádio), mas cada futebol tem o torcedor que merece. Em outras palavras o futebol, que além de não primar pela arte ainda promove o inexplicável ódio velado (sob o manto do humor e da secação), entre flamenguistas e vascaínos resulta no que vimos no último domingo.
Não é a minha intenção aqui dizer que a brincadeira, e a gozação, (que se levadas de forma sadia, podem fazer parte do processo de catarse), tem de acabar, ou que se ninguém encarnar em mais ninguém o problema da violência nos estádios seria resolvida. Não até porque tal pensamento é ingênuo demais. Falo sim, de uma educação que permita a cada pessoa fazer uma analise de si mesma e expurgar de si os ressentimentos que redundam em barbáries como a vista neste último domingo.
A lei diz não matarás, na verdade vai além, a lei ensina a não odiar, mas a amar o próximo como a si mesmo. Jesus foi além da lei e ensinou que atos como o visto nas imagens do jogo de domingo são fruto da ira e do ódio que carregamos dentro de nós. Do ponto de vista cristão afirmo que precisamos de mais arte e graça nos gramados, a fim de sermos purgados do ódio.
 
Marcelo Medeiros
 

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