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quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Bullying, minha experiencia

 

Assisti recentemente ao filme cyberbullybg, que pode ser acessado aqui. Vi também O Globo Repórter (aqui). E creio ser este o assunto do momento. Até porque o mesmo se mescla a uma longa tradição de preconceito. Diante disto gostaria de compartilhar um pouco da minha experiência com o assunto. Não faço como técnico, mas como alguém que teve a infelicidade de nascer pobre, negro e viver em um momento em que os padrões de beleza eram sempre caucasianos.
A definição da palavra ainda não se encontra em nossos dicionários, mas a julgar pelas informações do Brasil Escola, consiste na estereotipação, ou estereotipia de indivíduos associada à violência, física, ou verbal, bem como no afastamento, ou isolamento dos mesmos. Os parâmetros curriculares do Ensino fundamental trazem nos seus objetivos que a educação tem como meta a formação de cidadãos críticos, que estejam preparados para se voltarem contra toda forma de dsicriminaçaõ e preconceito. Mas na década de oitenta não havia tamanho comprometimento. À título de exemplo, gostaria de narrar a minha história.
Na antiga quinta serie (atual sexta) do antigo primeiro grau (atual Ensino Fundamental I e II), conheci uma professora que amava tirar pontos dos alunos que se sentavam atrás, dentre os quais eu. Um dia era ponto tirado porque estava rindo, mesmo que não estivesse; no outro era ponto tirado, pasme, porque havia caído em uma brincadeira sem graça. Em outro, porque ao ser perguntado por que estava rindo, respondi: "minha arcada dentaria é saliente" (em outras palavras sou dentuço).
Não bastasse toda esta tortura, ainda tinha de copiar textos e mais textos, visto que a qualquer momento o caderno poderia ser visto e mais pontos poderiam ser tirados, ou acrescentados. Em apenas uma ocasião o caderno foi visto e um ponto foi acrescentado. A lição que ficou? O erro é muito mais valorizado do que o acerto
Agora aqui vai uma explicação. Em primeiro lugar, não me assentava atrás porque gostava de fazer bagunça. Segundo, nunca fui o sujeito de andar em grupos de meninos, sempre preferi a companhia feminina. Terceiro, e obvio, ser bagunceiro não era a minha. Por último, como negro nunca gostei de ser visto e nem de me expor, pois me achava feio. Na verdade não haviam naquela época negros que pudessem me servir padrões de beleza. Hoje temos Will Smith, Denzel Washington, tivemos o nosso Norton Nascimento, mas na década de oitenta, o que tínhamos eram um Michael Jackson, que tinha o poder de se tornar branco (pelo menos foi assim que a imprensa vendeu o que estava acontecendo com ele, somente no período de minha adolescência a verdade veio à tona, ele tinha vitiligo). Assim fui vivendo pensando que era feio. Sempre fui retraído, não bastasse tudo isto tive de conviver com as encarnações dos colegas e com aquela professora.
A crise estourou em sala de aula, quando em mais uma das ocasiões a professora além de resolver tirar mais um ponto, resolveu curtir com a minha cara (os leitores sabem que não costumo usar estes termos). Ela entrou em sala de aula e o bom dia da mesma foi este: quem soltou um barbantinho cheiroso? (um tipo de bombinha que ao ser deflagrada exalava um odor fétido insuportável). Imagine se um chato de nascença como eu soltaria uma coisa dessas ainda mais na aula da megera indomável?! A despeito disto, quem melhor do que o dentuço e negro para levar a culpa. Afinal, era o recordista de perda de pontos.
Ao perceber o obvio, que eu era o judas de sempre a dita cuja me perguntou de onde eu era. Disse ser carioca, nascido em são Cristóvão, com aquele esse bem puxado, meio paulista, meio mineiro. Foi o suficiente para que virasse o comedia da turma. Ouvi coisas do tipo carioca você não é (como se apenas houvessem marginais fora do Rio), mas o pior ainda estava por vir. Na maior inocência disse que era descendente de mineiros, mas que havia nascido no Rio sim, isto constava em minha certidão de nascimento, e o que ouvi?  Que nós migrantes destruímos o belo Rio de Janeiro, que povoamos estas cidade e criamos a violência aqui, etc... . O sotaque, a cor da pele, a etnia, os motivos estavam todos ali.
Agora caro leitor, suponha que ela estivesse certa, o que eu que nunca roubei, ou furtei em minha vida, que estava ali naquela instituição escrota, que acreditava e ainda acredito nos estudos tinha á ver com toda aquela baboseira? Nada! Não conheci pessoa alguma que trabalhasse mais do que minha mãe. E, se acredito na educação como meio de ascensão social, tal se deve à cultura que recebi em casa. Mas é desnecessário dizer que todos estes fatores foram ignorados pela professora.
Após a fantástica sessão de bullying, veio a parte mais humilhante sair de sala para a coordenação. Enquanto isto, uma das minhas colegas foi a minha heroína, eu diria que foi o instrumento de Deus para que a justiça fosse feita, como? Enquanto estava na coordenação, a garota citada disse á professora como era a minha rotina de vida fora da escola. Segundo o testemunho que a própria professora dera e que os demais colegas corroboraram esta colega, que se mostrou amiga dissera à professora que minha vida era sair às tardes e ir á Igreja, retornando após o culto, fora estas ocasiões ele sequer é visto na rua. E pasmem, esta era a verdade, visto que além de ser crente desde cedo, tivera minha primeiras experiências espirituais ainda aos sete anos de idade aqui e aqui. Honestamente, não sei como consegui, se é que de fato tenha conseguido, superar tal experiência. Não sei como aprendi a gostar tanto de ler e escrever como gosto. Creio que isto tenha mais a ver com minha experiência religiosa do que com a Escola e com a educação em si, visto que ainda que em proporções menores, sempre tive de lidar com o preconceito e o bullying, ora por parte dos colegas, ora por parte dos professores.
Curiosamente faço parte de um grupo religioso que é apontado como sendo reacionário, e ainda assim minha historia pessoal me diz que foi justamente neste grupo, que tive acesso a uma experiência que me possibilitou superar tais traumas sem recorrer á violência. O caso acima narrado se resolveu com o posicionamento de uma colega, que foi corroborado pelo de outras, e também com o posicionamento de minha mãe e minha avó materna.
Nunca gostei de contar os meus problemas (aquilo que me ocorria na escola) para nenhuma das duas. Naquela época a filosofia era a seguinte: os adultos estão sempre certos e vocês crianças erradas. Mas me surpreendi com o fato de que ao narrar o ocorrido tive a solidariedade de minha mãe, que foi a escola, e com todo o respeito aos profissionais envolvidos com a minha educação escolar expos que as coisas lá em casa não eram bem assim. Em outras palavras: eu não era nenhum santo, mas também não era o demônio que estavam pintando. Como já me reconhecia pecador e não eram minha ambição ser canonizado, ficou bom demais. De lambuja a professora se afastou (tudo o que posso dizer é que ela teve problemas de extrema gravidade com outros alunos, e queixa sobre queixa....).
Encerro minha narrativa dizendo que nem todos terão uma experiência religiosa que sirva de apoio ás suas vidas, mas todos podemos ter a solidariedade de alguém. Todos sim, podemos ser solidários á alguém. Me consolo hoje, e lido com o fato de que minhas  feridas podem ser cura para outra pessoa. Como? O autor de Hebreus afirma que todo o sacerdote é alguém tirado dentre o povo, e ao mesmo tempo é rodeado de fraqueza, a fim de que possa se compadecer de outros. Ao longo da vida tenho usado a minha experiência para apoiar pessoas que passam pelas mais diversas dificuldades. Ao mesmo tempo em que curo, sou curado.
Me despeço com um abraço solidário aos que sofreram e ainda sofrem bullying e preconceito. Com os rogos de que de alguma forma esta narrativa possa ajuda-los. Aconselho a confiança nos pais e verdadeiros amigos, eles são sempre uma força em momentos como este. E para a continuidade do processo de cura, o auxílio ás pessoas que passam por este tipo de problema.
 
Abraços, Marcelo Medeiros.

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