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sábado, 3 de maio de 2014

Dons de elocução


Após a abordagem do conceito de dons (aqui), do proposito dos mesmos (aqui), bem como da divisão dos dons alistados em I Co 12. 8 - 11, necessário se faz com que se concentre nos dons de elocução. O termo é definido da seguinte forma: maneira pela qual nos exprimimos (aqui), sendo esta então uma forma de exprimir as ideias por meio de palavras. São dons de elocução: Variedades de línguas, Interpretação de Línguas, Profecia.
Por meio de tais dons aquilo que Deus revela é expresso para toda a Igreja. A Bíblia é clara em recomendar que se busque o dom de profetizar, uma vez que o que profetiza exorta toda a Igreja, ao passo que o que fala em línguas edifica a si somente. Mas ainda assim, não de pode, nem se deve proibir o falar em línguas.

I) O DOM DA PROFECIA

O conceito lexical de profecia abrange desde o ensinamento, ou exortação moral divinamente inspirado, e falado por algum profeta; a anunciação e a interpretação dos propósitos divinos, até a simples predição de eventos futuros. A profecia bíblica, via de regra se concentra mais nos elementos de ensino, exortação, repreensão, do que na predição de eventos futuros, ao menos esta é a ideia de Gordon Fee e Douglas Stuartt. A seguir faço algumas considerações a respeito da profecia, para então falar do dom de profecia.

i) A profecia no Antigo Testamento

Um exemplo clássico é que Abraão, Isaque, Jacó e José são chamados de profetas (Gn 20. 7; Sl 105. 13 - 15), e destes apenas Jacó e José proferem oráculos de caráter preditivos. O mesmo pode ser dito em relação a Moisés, que passa a maior parte do tempo julgando e instruindo o povo, somente no quinto livro que ele pronuncia alguns oráculos proféticos de caráter preditivo.
Em toda a atuação de Elias, somente no tocante a morte de Jezabel que ele pronuncia um oráculo preditivo, mas sua atuação é de anuncio dos juízos de Deus sobre Israel. O mesmo se dá com os profetas literários. Se eles vivessem vaticinando o futuro, a mensagem dos mesmos não teria a mínima relevância para os seus contemporâneos.
São os profetas escritores que trazem uma profecia diferenciada. Junto da inspiração, vem o selo de autoridade divina para com as palavras dos mesmos de sorte que elas ganham status de palavra de Deus. De igual modo eles vindicam sobre si que estão falando em nome do Senhor, e sob a inspiração do Espírito do Senhor (Is 1. 2; 61. 1, 2; Mq 1. 2; 3. 8). A palavra destes profetas, via de regra, não é  bem aceita em seu tempo, somente depois, de muito tempo, como no caso de Jeremias e Amós, os mesmos foram aceitos como profetas do Senhor (Dn 9. 2; At 15. 15, 16).
Aqui é mais do que justo a menção ao comentário do autor da revista, para quem a igreja deve de ser conduzida pela orientação das Sagradas Escrituras, ao invés de o ser por supostos profetas, visto que não poucos lideres não tomam uma única atitude sem antes consultar um profeta. O que posso afirmar é que nas Escrituras este hábito foi cultivado pelo povo, no período dos juízes, e pelos reis no período monárquico, sendo que em ambas as ocasiões, não havia Escritura, ou texto acessível para o povo se orientar.
Inicialmente tais profetas eram chamados de videntes (ra'ah [רֹאֶ֑ה]). É o caso de Samuel, por exemplo no contexto em que Saul, vai consultá-lo a respeito da jumenta de seu pai, que se perdera (I Sm 9. 9, 11, 18). O texto da a entender que a função do profeta se assemelha a de um adivinho. E a importância desta percepção se deve ao fato de que na atualidade o profeta é visto da mesma forma. Todos querem um profeta que lhes diga o seu futuro, e de preferencia que confirme os desejos do seu coração (Jr 42 - 43).
Voltando ao texto e ao contexto de Samuel, necessário se faz notar que o mesmo não conformou sua vida e ministério ao costume do povo, antes anunciou para Saul, qual era a vontade de Deus para sua vida. Com isto este, que foi ao mesmo tempo vidente e o último juiz de Israel, deixou um maravilhoso legado para os aspirantes a profeta da atualidade.

ii) O profeta no Novo Testamento e o dom de profecia

Jesus afirmou: todos os profetas e a lei profetizaram até João (Mt 11. 13 ACF), dando a entender com isto que a profecia com status de escritura durou somente até João Batista (Lc 16. 16). No Novo Testamento, os sucessores dos profetas são os apóstolos. Logo, a profecia não possui mais o status de escritura, de norma divina, etc...
Os únicos profetas do período apostólico primitivo são as filhas de Felipe (At 21. 9), e ainda assim, é dito não que elas eram profetisas, mas que profetizavam. Neste mesmo texto Lucas registra a chegada de um profeta (προφητης), por nome de Ágabo, que previu a prisão de Paulo em Jerusalém (At 21. 10 - 18). O que faz Paulo, contrariando seu próprio conselho à igreja de Tessalônica (I Ts 5. 20, 21),  ignora a profecia e sobe para Jerusalém, sofrendo todos os males que Ágabo dissera que ele haveria de sofrer. Desobediência gratuita, não! Ele afirmara, independente de profecia: agora, eis que, ligado eu pelo espírito, vou para Jerusalém, não sabendo o que lá me há de acontecer,
Senão o que o Espírito Santo de cidade em cidade me revela, dizendo que me esperam prisões e tribulações
(At 20. 22, 23 ACF). Isto indica claramente que a palavra apostólica, ao invés da profética, era a norma nos tempos do Novo Testamento.
E o dom de profecia? Foi dado a Igreja não para normatizar a conduta da mesma, mas para edificar, consolar a exortar (I Co 14. 3). Mas está sujeita ao exame pessoal uma vez que a recomendação é: Não desprezeis as profecias. Examinai tudo. Retende o bem (I Ts 5. 20, 21 ACF). O verbo traduzido, por provar, ou examinar aqui é δοκιμαζω (dokimazoo), cujo sentido é o de por, ou colocar á prova. Além de conformada com a sadia doutrina das escrituras sagradas, uma verdadeira profecia tem de edificar, exortar, e consolar, mas jamais nortear a vida pessoal e os rumos da congregação.

II) VARIEDADES E INTERPRETAÇÃO DE LÍNGUAS

A habilidade para falar em outras línguas é descrita como um sinal (semeia [σημεια]), que segue os que creem (Mc 16. 17, 18 [aqui]), e como evidencia da descida do Espírito Santo, na descida do Espirito Santo no pentecoste. De acordo com o registro de Lucas,
E foram vistas por eles línguas repartidas, como que de fogo, as quais pousaram sobre cada um deles. E todos foram cheios do Espírito Santo, e começaram a falar noutras línguas, conforme o Espírito Santo lhes concedia que falassem (At 2. 3, 4 ACF). 
Esta língua não é produto de um caso êxtase, uma vez que os que as ouviam, entendiam os apóstolos falando das grandezas de Deus em sua língua nativa (At 2. 4 - 11). O termo αποφθεγγεσθαι(apophtheggesthai), indica a fala em tom alto e claro, e é empregada na LXX como equivalente para profetizar (Dt 32. 2; I Cr 25. 1; Ez 13. 19; Zc 10. 2). Para todos os efeitos os ouvintes da língua aqui entendem claramente o que está sendo falado. Não há neste relato uma confusão, quanto á mensagem que os apóstolos estão transmitindo.
Outro fator a ser considerado é que a expressão que nossas Bíblias traduzem como língua em At 2. 6 no grego é διαλεκτω (dialektoo), indicando com isto que os discípulos que haviam recebido da parte de Deus a capacidade de falar em outros idiomas e de falar nas variações destes mesmos, afinal, διαλεκτω é a palavra da qual se origina nosso termo dialeto, cujo sentido é o de uma variedade regional (ou social, ou etária) de uma língua. Uma exegese deste texto já deixa claro que as línguas não são para causar confusão, mas para anunciar as grandezas de Deus.
Experiências de derramamento de poder tais como esta se repetem em Samaria (At 8. 15 - 17), na casa de Cornélio (At 10. 43 - 47), e em Éfeso (At 19. 6). Exceto Samaria, em todos se diz que falaram em outras línguas (λαλουντων γλωσσαις), sendo que na casa de Cornélio, ao mesmo tempo em que falavam em línguas, magnificavam a Deus (At 10. 46), ao passo que no pentecostes e em Éfeso, profetizavam (At 19. 6).
Há no pentecostalismo a ideia de que as línguas são evidência do Batismo com o Espírito Santo. Em Batismo na Plenitude do Espírito Jonh Stott afirma que o dom do Espírito é a salvação, indicando com isto que ele se posiciona a favor do conceito tradicional, que entende o Batismo com o Espírito, como sendo a conversão.
O problema com este entendimento é que no caso de Cornélio, por exemplo, Pedro e os demais que estavam com ele tomaram as línguas como evidência de que o dom do Espírito Santo (dorea ton hagios pneumatos [δωρεα του αγιου πνευματος]), havia sido derramado sobre os  gentios. O impasse em torno da questão permanece. Foi, ao que parece, na Igreja de Corinto que Paulo precisou normatizar a questão das línguas, a fim de que as mesmas não fossem confundidas com o êxtase, ou transe estático em que entravam os adeptos de outras religiões.  
O que importa é que o infiel, ao chegar em nossas assembleias veja as manifestações de línguas acompanhadas da interpretação, a fim de que não sejamos julgados como loucos, mas que ele ouça Deus falando por nosso meio, e tenha os segredos do seu coração manifesto, e glorifique a Deus e reconheça que o Senhor está naquele lugar.
De sorte que as línguas são um sinal, não para os fiéis, mas para os infiéis; e a profecia não é sinal para os infiéis, mas para os fiéis. Se, pois, toda a igreja se congregar num lugar, e todos falarem em línguas, e entrarem indoutos ou infiéis, não dirão porventura que estais loucos?
Mas, se todos profetizarem, e algum indouto ou infiel entrar, de todos é convencido, de todos é julgado. E, portanto, os segredos do seu coração ficam manifestos, e assim, lançando-se sobre o seu rosto, adorará a Deus, publicando que Deus está verdadeiramente entre vós.
Que fareis pois, irmãos? Quando vos ajuntais, cada um de vós tem salmo, tem doutrina, tem revelação, tem língua, tem interpretação. Faça-se tudo para edificação. E, se alguém falar em língua desconhecida, faça-se isso por dois, ou quando muito três, e por sua vez, e haja intérprete. Mas, se não houver intérprete, esteja calado na igreja, e fale consigo mesmo, e com Deus.
E falem dois ou três profetas, e os outros julguem. Mas, se a outro, que estiver assentado, for revelada alguma coisa, cale-se o primeiro. Porque todos podereis profetizar, uns depois dos outros; para que todos aprendam, e todos sejam consolados (I Co 14. 22- 31). 
 
Em Cristo, Pr Marcelo Medeiros 

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