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quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Lição da EBD n° 8: A suprema aspiração do crente


Nossos dicionários definem a palavras aspiração como sendo um desejo veemente, um anelo. Ao lermos as palavras de Paulo na carta aos Filipenses percebemos que ele considerou todo o seu passado, toda sua tradição religiosa como refugo, e tudo pelo desejo de participar dos sofrimentos de Cristo, para ser participante da sua ressurreição (Fp 3. 10, 11). Mas as aspirações de Paulo não param por aqui. Ele sabe que sua verdadeira cidadania é celestial, e que para alcançar a promessa, ele precisa estabelecer alvos definidos. Ele disserta sobre o tema empregando a metáfora da vida do atleta. Neste post pretendo falar a respeito destes termos e de como eles implicam em nossa vivencia cristã prática.

Não que eu já tenha obtido tudo isso ou tenha sido aperfeiçoado (Fp 3. 12a NVI).

Cleon Rogers e Fritz Rienecker afirmam que o emprego da expressão ελαβον (elabon), que se trata do verbo  λαμβανω no aoristo, indica com isto que Paulo tinha clara percepção de que a despeito do caráter de sua conversão, ele não tinha alcançado ali, no caminho de Damasco, muito menos na casa de Judas, na rua chamada Direita, o estado final de sua carreira espiritual.
Ao longo desta série de estudos temos pontuado o caráter duplo da salvação. Existem coisas que ocorrem de uma vez por todas, é o caso da morte de Cristo, por exemplo (Hb 7. 27; 9. 26). Mas há aspectos em nossa salvação que demandam constante aperfeiçoamento espiritual. É nisto que consiste o desenvolver a salvação com temor e tremor (Fp 2. 12, 13).
Paulo afirma que ainda não foi aperfeiçoado, ou na verdade que ainda não tinha alcançado o seu alvo supremo, este é o sentido do uso do termo τετελειωμαι (teteleioomai), de τελειω (teleioo), ser completo, ou ter alcançado um fim. Ele faz tal afirmação não porque lhe faltasse convicção de sua salvação, ou não tivesse certeza do que Deus havia feito em sua vida, mas porque de fato não havia alcançado a ressurreição dos mortos, ou seja, o momento em que seu corpo seria definitivamente conformado ao de Cristo (Fp 3. 20, 21).
Além do mais, na visão de Paulo a ressureição, à semelhança da que ocorreu com Cristo, bem como os demais bens escatológicos, estão ligados à semelhança nos sofrimentos de Cristo. Escrevendo aos irmãos de Colosso ele mesmo afirma: agora me alegro em meus sofrimentos por vocês, e completo no meu corpo o que resta das aflições de Cristo, em favor do seu corpo, que é a igreja (Cl 1. 24 NVI). Em outras palavras Paulo ainda está cumprindo a sua trajetória do calvário. Mas ele sabe que após cumprir esta etapa, o que o aguarda é estar com Cristo.
 
mas prossigo para alcançá-lo, pois para isso também fui alcançado por Cristo Jesus (Fp 3. 12b NVI)
 
O mais interessante neste texto é a total ausência de presunção da parte de Paulo, uma vez que διωκω δε ει και καταλαβω (diokoo eis kai katalaboo), também pode ser traduzido da seguinte forma: prossigo para ver se alcanço, indicando com isto que não havia presunção por parte do apostolo, tal como a observada nos cristãos judaizantes que defendiam a circuncisão.
Não são poucos os teólogos em nosso solo pátrio que fazem uso destas palavras de Paulo para combaterem as ideias do calvinismo, ou da teologia reformada (que muito aprecio). Mas a correta interpretação destas palavras depende do contexto imediato da epistola e de uma visão global da Teologia de Paulo.
Particularmente em relação à Escatologia, percebemos em Paulo uma dupla perspectiva, a de realização e a de devir. Tal será conceituado em nossa Teologia moderna como sendo a tensão do já e do ainda não. Assim, da mesma forma em que escrevendo a uma única comunidade Paulo esboça a certeza de que estará vivo no momento do arrebatamento (I Co 15. 51 - 55), na sua segunda carta a esta mesma comunidade ele afirma que passou por uma tribulação tal que se desesperou da própria vida e colocou a sua esperança em Deus que ressuscita aos mortos (II Co 1. 8, 9).
Depois de passado o momento ele afirmou: Ele nos livrou e continuará nos livrando de tal perigo de morte. Nele temos colocado a nossa esperança de que continuará a livrar-nos, enquanto vocês nos ajudam com as suas orações. Assim muitos darão graças por nossa causa, pelo favor a nós concedido em resposta às orações de muitos (II Co 1. 10, 11 NVI).
Na carta aos Filipenses percebemos o mesmo padrão da parte do apostolo. Ele tem, ao mesmo tempo, o desejo de permanecer com os irmãos para a alegria deles como tem também a vontade partir e estar com Cristo (Fp 1. 21 - 25). Tal se dá pelo fato de que à nossa semelhança do desejo de Paulo é o de ser revestido com um corpo de glória incorruptível (II Co 4. 14 - 5. 5). Assim, quando ele diz: não queremos ser despidos, mas revestidos da nossa habitação celestial, para que aquilo que é mortal seja absorvido pela vida (II Co 5. 4 NVI), ele está afirmando que seu maior desejo é o de passar pela experiência do arrebatamento ainda nos dias de sua vida. Daí a afirmação de que ainda não havia alcançado os  bens escatológicos.
A despeito de tudo isto, Paulo sabe que foi alcançado por Cristo, em outras palavras sua conversão é fruto da graça, do amor e da misericórdia de Deus em sua vida. Tanto que escrevendo aos irmãos da Galácia ele afirma: Deus me separou desde o ventre materno e me chamou por sua graça. Quando lhe agradou revelar o seu Filho em mim para que eu o anunciasse entre os gentios (Gl 1. 15, 16 NVI). 
À luz destas palavras é possível obter um maior entendimento a respeito do que Paulo queria dizer quando afirmou que prosseguia para alcançar aquilo para o que tinha sido alcançado por Cristo Jesus. No caminho de Damasco e na visão dada ao discípulo Ananias, Deus deixa claro que aos seus olhos Paulo era um vaso escolhido para levar o seu nome aos reis e as nações da terra (At 9. 15, 16). Assim concluo afirmando que foi Cristo quem buscou Saulo, e não o inverso.
 
Irmãos, não penso que eu mesmo já o tenha alcançado, mas uma coisa faço: esquecendo-me das coisas que ficaram para trás e avançando para as que estão adiante (Fp 3. 13 NVI) 
 
Aqui mais uma vez o cuidado é necessário, visto que o termo κατειληφεναι (Kateiliphenai), de καταλαμβανω significa alcançar totalmente. Diante disto não seria nada absurdo o entendimento de que o texto em apreço poderia ser traduzido assim: não penso que eu mesmo já o tenha alcançado totalmente, o que torna mais claro ainda a dimensão escatológica do já e do ainda não.
Paulo fez menção deste mesmo verbo no verso 12, ao afirmar que prosseguia para alcançar. Este mesmo era empregado de forma alusiva aos jogos públicos para expressar a ideia de empregar um esforço impetuoso, com vistas a agarrar, de obter prêmios em uma competição. Esta mesma ideia aparece em sua carta aos irmãos de Corinto (I Co 9. 24).
Tanto o termo avançar quanto o prosseguir em grego são na verdade o verbo επεκτεινομαι (epekteinomai), cujo sentido é o mesmo de empregar todos os esforços a fim de alcançar algo. Tanto que Robinson traduz como: estender-se sobre, estender mais além, indicando com isto um esforço parecido como o feito por um corredor fundista que no fim da prova joga o corpo um pouco mais para frente a fim de consolidar sua vitória, ou o nadador que busca tocar na borda da piscina a fim de confirmar a posição em que chegou.
Na vida de Paulo tal movimento se expressou em sua total renuncia à tradição e religião judaica e no total investimento em Cristo Jesus, visando ao prêmio da soberana vocação. Mas ele se vê ainda em meio à competição, não a dá por encerrada, daí ele que mesmo afirmar: prossigo para o alvo, a fim de ganhar o prêmio do chamado celestial de Deus em Cristo Jesus (Fp 3. 14 NVI).

prossigo para o alvo, a fim de ganhar o prêmio do chamado celestial de Deus em Cristo Jesus (Fp 3. 14 NVI).

O termo que Paulo emprega para alvo aqui é σκοπον (skópon), que para Robinson equivale a um objeto distante em que se fixa o olhar, uma meta, um alvo. Os tradutores da LXX empregaram a mesma palavra para expressar o alvo estabelecido por um flecheiro (Jó 16. 12; Lm 3. 12). σκοπον pode ser também uma marca na qual se fixa o olhar. Aqui para todos os efeitos se mantém a mensagem de que o apostolo tem um alvo supremo e sua corrida se dá em direção ao mesmo.
O alvo do apóstolo e consequentemente de todo o cristão deve de ser o prêmio (βραβειον [brabeion]) da soberana vocação em Cristo Jesus. Neste caso, βραβειον é o prêmio recebido pelo ganhador nos jogos olímpicos. Na carta aos Coríntios Paulo afirma (indiretamente, é claro), que nossa recompensa plena por todos os perigos e males aos quais nos sujeitamos em razão de nossa escolha pelo Evangelho e discipulado é justamente este prêmio da soberana vocação. Daí que nossa trabalho não seja vão no Senhor (I Co 15, 57, 58).

Todos nós que alcançamos a maturidade devemos ver as coisas dessa forma, e se em algum aspecto vocês pensam de modo diferente, isso também Deus lhes esclarecerá (Fp 3. 15 NVI).

A expressão τελειοι (teleioi), pode ser traduzida como "perfeito", que na língua grega nada tem a ver com o significado que nós atribuímos à perfeição. Nós a entendemos a partir daquilo que reúne todas as qualidades; que não tem defeitos; ideal, impecável; excelente. O termo ideal, por si só já nos coloca diante daquilo que é quimérico, que está para além do mundo da experiência.
Mas conforme dissemos acima a perfeição aqui tem a ver com o completar de um percurso, de um ciclo. É com esta ideia que Tiago trabalha quando afirma: E a perseverança deve ter ação completa (τελειον), a fim de que vocês sejam maduros (τελειοι), e íntegros, sem lhes faltar coisa alguma (Tg 1. 4 NVI). A perfeição no primeiro sentido é algo que se obtém ao fim de um processo de aprendizagem, quando completamos a prova, ao passo que a perfeição maturidade, vem com o aprendizado. Aqui o homem perfeito é aquele que após passar uma serie conseguiu extrair a lição e desenvolver um tipo de caráter. É neste sentido que Paulo diz que alcançamos a maturidade.
Este chamado não é compreensível à primeira vista, daí Paulo apelar ao fato de que as coisas que não compreendemos no presente momento nos serão esclarecidas e reveladas na medida em que caminhamos, que prosseguimos em nossa carreira. Exatamente por este motivo Paulo emprega o termo αποκαλυψει (apokalupsei), cujo sentido denota a remoção de um véu, que por sua vez permita a contemplação plena do objeto. Na medida em que entendemos a esperança do nosso chamado, compartilhamos dos mesmos sentimentos e disposições presentes em Paulo.

Tão-somente vivamos de acordo com o que já alcançamos (Fp 3. 16 NVI).

Viver de acordo com o que alcançamos é proceder de forma coerente com o chamado de Deus. O termo στοιχειν (stoichein), indica um andar retilíneo, tal como os das tropas em marcha de batalha. O emprego metafórico da mesma indica um procedimento pautado por um ensino, ou doutrina. Daí a afirmação: Tão-somente vivamos de acordo com o que já alcançamos.
Encerro rogando a Deus que este estudo traga muita edificação aos que o lerem e profundo proveito aos que compartilharem do mesmo com os respectivos alunos da Escola Bíblica Dominical.

Em Cristo Pr Marcelo Medeiros

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